2 de março de 2013
Aracne
Aracne era uma bela moça, filha de um tintureiro de lã, na cidade de Colofon. Sendo filha de quem era, desde cedo acostumara-se a bordar e tecer, revelando um talento inato para essa arte. À medida que Aracne foi tornando-se adulta, sua arte também mais e mais se aperfeiçoava, de tal sorte que logo seus trabalhos eram disputados por todas as mulheres da cidade. Senhoras de outras localidades também acorriam, sem se importar com a distância, desde que pudessem levar para casa algum trabalho saído das mãos da extraordinária artesã. Todas essas moças e senhoras elogiavam o seu trabalho, e enquanto ela crescia sua fama corria por todo o território, até mesmo as ninfas dos rios e lagos próximos deixavam as águas para admirar os trabalhos de Aracne.
Um dia, Ártemis, que ficara sabendo do assunto pelas ninfas, resolveu contar o que ocorria a Atena:
— Atena, acho que finalmente você encontrou uma rival à altura — disse Ártemis, com um tom de ironia.
Ora, deuses e deusas não suportam que lhes falem nesse tom, ainda mais quando um de seus atributos é posto em dúvida. A deusa, considerada a protetora das obreiras e dos artesãos, não admitia que uma reles mortal pudesse sequer emparelhar com as suas obras, respeitadas em todo o Olimpo.
— E quem seria esta? — disse Atena, com a voz de indiferença.
— Aracne é o seu nome — disse Ártemis que sob o pretexto de fazer um favor saboreava, na verdade, o despeito da outra.
Mesmo não tendo mostrado tanto alarme enquanto conversava com Ártemis Atena decidiu conferir o trabalho da moça pessoalmente. Metamorfoseando-se numa velha, a deusa rumou para o país onde vivia Aracne. Quando lá chegou, encontrou a artesã sentada à beira de um regato, cercada por um exército de ninfas, que deitadas sobre a relva admiravam o seu magnífico trabalho.
— Bom dia, minha jovem! — disse, aproximando-se.
— Bom dia, minha senhora — disse Aracne, sem desviar os olhos de seu imenso bordado.
— Que belo trabalho está fazendo! — exclamou Atena, apoiada a seu bordão, cujo elogio fingido escondia uma secreta admiração.
— É o que todos dizem — falou Aracne, com um ar de presunção que irritou Atena.
— Mas convém agradecer sempre a Atena este dom recebido — disse a velha.
— Ora, e que méritos eu teria se devo exclusivamente a ela meu talento? — disse Aracne. — Ela que cuide de seus bordados que eu cuido dos meus.
— Oh, não diga isto! — disse a velha, escandalizada. — Não percebe que é uma ingratidão sem tamanho?
— Vovó, por favor, me deixe trabalhar em paz — disse a jovem, pondo um fim na conversa.
— Então é esta, a ideia que tens de mim, atrevida? — disse Atena, desfazendo-se do disfarce e surgindo em todo o seu esplendor diante da tecelã e das ninfas, que recuaram, assustadas e reverentes.
Aracne, contudo, não demonstrou grande impressão e prosseguiu a bordar como se nada houvesse acontecido.
— Olhe para mim, sua mal-agradecida! — bradou Atena.
— Estou trabalhando, não está vendo? — disse Aracne, com maus modos.
— Proponho, então, um desafio! — disse Atena, certa de que a vitória seria sua.
— Pois, diga. — respondeu a moça, que não queria outra coisa senão medir-se com a própria deusa dos trabalhos manuais.
— Vamos, ninfas ociosas, tragam toda lã que puderem encontrar e a depositem aqui, em partes iguais, a nossos pés — ordenou Atena.
As duas mostravam-se extremamente arrogantes. Não se podia saber qual seria a vencedora daquele empolgante confronto. Ao sinal da deusa, as duas começaram a trabalhar. Os dedos ágeis desfiavam a lã e a colocavam rapidamente sob os pentes do tear que tinham à frente.
Os fios deslizavam, esticados ao máximo, parecendo as cordas afinadas de um piano. Nem bem saíam da máquina e dedos os capturavam, comprimindo-os sob as agulhas douradas.
Cada qual tinha aos joelhos uma grande tela, na qual deveriam bordar um grande tapete figurativo. Atena escolhera fazer o retrato de uma disputa que tivera com Poseidon enquanto Aracne bordava magistralmente a cena do rapto de Europa por Zeus.
Aos poucos as figuras ganhavam forma nas armações quadradas que cada qual tinha diante de si. Os fios de diversas cores passavam pelos dedos das mulheres como os fios que tecem o arco-íris, misturando-se numa mesma maçaroca, mas saindo separados e uniformes sobre a tela.
— Veja, a tela de Atena está mais bela — dizia uma ninfa, observando o trabalho da deusa, que começava a ganhar forma diante dos olhos de todas.
De fato, o mar, os peixes, o deus Poseidon com seu tridente, tudo parecia adquirir vida própria, enquanto os dedos finos da deusa tramavam agilmente as linhas de diversas cores.
— Não, o de Aracne é mais belo — disse outra ninfa, abaixando o tom de voz para não ofender a deusa.
O tapete de Aracne, com efeito, não ficava a dever nada ao da sua rival em matéria de cor, beleza e vivacidade. Todas podiam ver aos poucos, o touro, que raptara Europa, ganhar forma sob as costuras. O alvo fio ia desenhando o contorno da bela jovem com tal perfeição que ela parecia estar viva e prestes a sair do tapete: seus pés erguiam-se a poucos centímetros da água de um anil perfeito, por sobre a qual era levada pelo animal.
À medida que as duas finalizavam o trabalho, a ansiedade e a expectativa das ninfas tornavam-se quase insuportáveis.
De repente, Atena pôs-se em pé, com um grito de triunfo:
— Pronto, amadora, apresente também o seu trabalho!
Aracne, dando o último nó em seu bordado, ergueu-o desafiadoramente.
— Que as ninfas julguem com imparcialidade! — disse, encarando a rival. Atena, arrebatando o tapete das mãos de Aracne, comeu-o com os olhos.
Enquanto o estudava, procurava com ele ocultar o próprio rosto, a fim de que as demais não vissem a admiração estampada na sua face. "Maldita! Seu trabalho tenho de reconhecer, é levemente superior ao meu!", pensou a deusa.
Temendo, porém, que as julgadoras chegassem à mesma conclusão, Atena perdeu a cabeça e fez em pedaços o belo tapete, mostrando que não admitiria sofrer uma humilhação.
— Oh, como você é cruel e injusta! — disse Aracne, tomada pela ira. Em seguida, rasgou também o trabalho da rival, sapateando em cima. — Veja o que restou de seu horrível bordado — disse, arreganhando os dentes para a deusa.
Isto foi demais para a paciência de Atena, que não podia admitir tamanha afronta de uma reles mortal. Erguendo sua mão sobre a cabeça de Aracne, rogou-lhe uma praga terrível. A moça, que ainda estava sob o efeito da cólera, não sentiu a princípio que seu corpo encolhia até transformar-se numa bola negra. Depois, de seus flancos saíram várias pernas cabeludas, o que encheu de horror as ninfas, que se lançaram à água, temerosas de que a deusa resolvesse puni-las também.
Tomando em suas mãos a asquerosa criatura, Atena pendurou-a em um galho.
— Veja, aí está o prêmio da sua arrogância! — disse a deusa, com uma risada de zombaria.
Já ia dando as costas para se retirar, quando percebeu um ruído vindo da árvore. Voltou-se e viu que a criatura negra movimentava suas pernas com extraordinária agilidade, costurando um manto com uma seda extremamente fina que retirava de seu dorso abaulado. Aos poucos Atena viu surgir diante de seus olhos, um magnífico bordado circular, que excedia a tudo que ela antes já fizera, como se Aracne, mesmo sob aquela odiosa forma, tivesse se tornado ainda mais talentosa com seus diversos braços.
Atena, reconhecendo-se finalmente derrotada, partiu correndo do maldito bosque.
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Oiee adorei o blog de vcs então gostaria q vcs escrevesem sobre as seguintes lendas: vitoria regia,vampiros e lobisomem obrigada :D
ResponderExcluirvamos escrever sim,nos do Holândes voador que agradeçemos pelo seu pedido e em breve traremos seus pedidos já postados
ResponderExcluiru.u kkkkkk
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